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Esta é mais uma das ilustrações que criei para o meu website.
O dia estava ameno na véspera do Equinócio de Outono, quando a mãe da jovem Kea a enviou à aldeia vizinha para levar um recado à sua tia Tellery. Após comer um pedaço de tarte de bagas que a sua tia lhe ofereceu, e tendo transmitido a mensagem, pôs-se a caminho de regresso a casa. – “Leva esta lamparina de azeite” – recomendara a sua tia – “não vá a noite surpreender-te no caminho!” .
Ainda era uma longa caminhada, e numa tentativa de abreviar o tempo da viagem, kea decidiu tomar um atalho pelo bosque. Sensivelmente a meio do caminho a jovem deteve-se confusa.
- “ Que estranho! ” – Pensou ela. - “ estou certa que o velho caminho de pedras deveria
estar mesmo ali ao lado daquela árvore.”
Com uma crescente sensação de desconforto, Kea vagueou, embrenhando-se cada vez mais pelo frondoso bosque de carvalhos a dentro, onde a vegetação era mais densa, as arvores mais antigas e veneráveis, de raízes nodosas e espessas. Quanto mais andava menos familiar lhe parecia o cenário. Já a ficar assustada e começando a aceitar o facto de que estava perdida, considerou as suas hipóteses e decidiu que o melhor era procurar abrigo, uma vez que começava a anoitecer. Resignada, abrigou-se numa reentrância formada pelas raízes de duas árvores muito antigas, decidida a esperar aí pelo amanhecer - graças a Deus pela lamparina de azeite da sua tia! A noite finalmente caiu, e a hora em que o sol dá lugar à lua impôs a sua inevitável presença.
Kea estava cansada da viagem, e as suas pálpebras começavam a pesar. Foi despertada por um som estranho – “Oh céus! Devo ter adormecido!” – pensou – “só espero que a lamparina dure até ao amanhecer!”. Subitamente, vindos da escuridão surgiram um esquilo e uma raposa vermelha, que pareciam não estranhar de todo a sua presença, como se a jovem tivesse estado ali, naquele preciso lugar desde o início dos tempos. Aproximaram-se com as suas expressões bondosas e encorajadoras, como se lhe estivessem a dar as boas vindas. Kea quase que podia ouvir as palavras que eles pareciam querer pronunciar: Não temas, estamos aqui para te proteger!
Acima da sua cabeça, soou o piar sereno de um mocho que se lhes veio juntar. Kea agradecia o seu calor, a noite estava fria. Sentia-se subitamente mais segura e confortável. Aninhada no meio dos animaizinhos, e agora mais serena com a sua presença tranquilizadora, o cansaço apoderava-se novamente do seu corpo, as pálpebras insistiam em se fechar.
Outro som, agora diferente, despertou-a daquele torpor agradável, um som que não se parecia com nada que já tivesse ouvido. Como murmúrios no vento, mas simultaneamente muito mais do que apenas isso...
Foi então que as viu…surgindo da inexorável escuridão da floresta, ora avançado brincalhonas na sua direcção, ora recuando esquivas, espalhando as suas auras luminosas pelo negrume do bosque. Bem-vinda irmanzinha, parecia o vento sussurrar.
Rodeada por aquela profusão de luzes coloridas, e tranquilizada pela presença reconfortante dos animais, caiu num sono profundo, sem sonhos. Quando por fim acordou, o sol brilhava alto no céu e para seu espanto, o velho carreiro de pedras estava mesmo ali, bem à sua frente, era inacreditável que não tivesse dado por ele antes…devia estar a ficar louca! Tinha a sensação de ter dormido durante dias. Decidiu que tudo não devia ter passado de um sonho e fez-se novamente à estrada.
- "ONDE ESTIVESTE minha menina"? - Gritou a sua mãe furiosa, quando chegou por fim à aldeia - "Os homens andam todos à tua procura pelos bosques da vizinhança há mais de uma semana...estávamos já a imaginar que tinhas sido atacada por um lobo, ou coisa pior! queres matar a tua pobre mãe do coração?"
Há mais de uma semana? – Pensou Kea, estremecendo com um arrepio que lhe levantou todos os pelos dos braços. Lentamente, de um lugar da sua memória que ela nem sabia que existia, emergiram as palavras que a velha mais velha da aldeia lhe dissera em certa ocasião. Kea nem sabia bem como se lembrava disso, afinal toda a gente sabia que aquilo não passavam de disparates de uma velha senil.
- "O tempo no país das fadas corre de forma diferente" - dissera ela - "podes passar lá uma noite e quando regressares descobrir que se passaram 100 anos!"
* Dedico esta história e esta ilustração à minha grande amiga Ana de Amsterdam, que gentilmente aceitou posar como modelo fotográfico para esta ilustração.